segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

A culpa é da Celine Dion


Conheceram-se na sala de espera de um consultório qualquer. Logo de cara trocaram olhares e ali surgiu um interesse mútuo.
Ela comprometida.
Ele, solteiro convicto.
Não se falaram mais durante um bom tempo.

Por esses acasos da vida, encontraram-se um dia, numa festa infantil. Ela estava acompanhada, ele só. Olharam-se novamente de forma mais intensa, mal conseguiam disfarçar. Situação constrangedora para ela, mas tremendamente excitante para os dois. Ah, o perigo!

Naquele momento ele decidiu que conseguiria seu número a qualquer custo, e usando artimanhas que não conseguiria descrever, conseguiu seu celular. Ensaiou semanas, até que tomou coragem e discou, ela atendeu sem saber o que a esperava. Depois da surpresa, a euforia.
Conversaram horas, descobriram muitas coisas em comum e divertiram-se falando das diferenças e, no final da conversa, timidamente combinaram um encontro. Almoço, para ser mais exato, acreditaram que assim era mais seguro para ambos, apenas um inocente almoço entre amigos.
No dia marcado, ela não conseguiu. Sentia-se culpada em mentir para o namorado, então inventou um desculpa esfarrapada e não foi.
Passaram-se alguns dias e ele não se deu por vencido, ligou novamente. E. dessa vez, um pouco desilududa com atual relação, ela marcou e foi encontrá-lo. E foi uma noite linda. Falaram sobre suas vidas, expectativas, anseios e tudo dava tão certo e era tão perfeito que passaram a ver-se constantemente.
Às vezes ele parecia um pouco obsessivo, mas ela fingia que não era nada. Às vezes, ela parecia um pouco controladora, mas ele fingia que era normal. Ele tinha muitas manias, tomava vários banhos por dia, não assistia televisão, não tinha comida ou água em sua geladeira. Ela dava desculpas para o jeito dele dizendo a si mesma que ele era solteiro, sozinho, e as pessoas sozinhas sempre desenvolvem manias estranhas.
Até que um dia, um fatídico dia, ela esperava por ele na sala e, para não sentir-se só, ligou o DVD e eis que surge Celine Dion e seus agudos, caretas e micagens.
Naquele dia, naquele fatídico dia, ela resolveu fingir mais uma vez. Mas dessa vez fingiu que ele não existia.

Moral da história: "Não há amor que sobreviva à Celine Dion".

terça-feira, 18 de maio de 2010

O pedido

Ela sempre adorou poesia, era quase sua segunda língua.
Copiava frases, sentia seu coração pipocar cada vez que lia Neruda e Clarice.
Encantava-se com Adélia e Cora. Chorava com Caio e Vinícius.
Mas seu coração batia mais forte por Rainer.
Lia e relia seus livros... e descobria coisas sobre si mesma, sobre o amor e o sofrimento, sobre a vida.
Vez ou outra arriscava-se nas palavras, escrevia mas não lia... medo de não gostar, de não ser boa o suficiente... sempre o mesmo medo...
Um dia tomou coragem e pediu para que ele lesse. Ela já havia mostrado para outras pessoas, mas parecia que a opinião dele era mais importante. Ela não sabia dizer porque, mas era assim que sentia e foi assim que fez.
Mandou por e-mail, não teve coragem de mostrar pessoalmente. Rapidamente ele respondeu, o que lhe deu uma sensação de alívio e ansiedade.
Sua resposta dizia: "sempre posso e quero ler o que vc escreve... vou ler mais um pouquinho"
E assim ela esperava, todos os dias, uma resposta, uma opinião, qualquer palavra, gesto. Nada... um enorme silêncio, vazio... talvez ela, simplesmente, não fosse boa o suficiente.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

18 de novembro de um ano qualquer




Combinaram o dia e a hora do encontro, sem ao certo saber o que os esperava.

Fazia tanto tempo...

Tantas coisas aconteceram durante esse período...

Todo reencontro é um pouco desajeitado, mas depois de tantos anos... qual será o jeito de encontrar?

Ele pensava: "o que ela vai dizer?"

Ela dizia: "o que ele vai pensar?"

Mistura de ansiedade, medo, saudade e dúvida.

Eles se lembravam muito bem um do outro, características físicas, jeito de olhar, a voz, os trejeitos, os sentimentos. Era certo que haviam mudado muito, envelheceram, tinham histórias dolorosas pra contar... tinham muito o que falar.

Às 13hs de um dia 18 de novembro de um ano qualquer eles se reencontraram e surpreenderam-se em ver que, apesar do tempo, eram os mesmos. Reconheceram-se no olhar, no toque, e perceberam que o tempo não havia passado.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Os papéis - parte I - "Mãe"



"É o meu melhor papel" - ela dizia
Sempre pensou que ser mãe era o que fazia de melhor em sua vida.
De todas as funções que uma mulher pode ter, e outras que a vida impõe, tinha certeza que ser mãe era seu destino.
Acreditava que todo ser humano vem predestinado, ela certamente estava predestinada à maternidade.
Tudo era agradável quando carregava no ventre o fruto de sua missão na terra, o filho.
A barriga, o peito, o colo, as canções de ninar, a preparação para a chegada, pura mágica de quem cumpre o seu destino.
Mas na realidade ela não tinha a menor idéia do que fazer com aquela pequena incógnita, aquele animalzinho faminto e voraz que reclama seu peito e sua presença incessante e permanentemente.
"É o meu melhor papel" - era o que ela dizia.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

O pijama

"O pijama é o túmulo do amor" disse Millor Fernandes.
Ele queria dar-lhe um presente, ela não sabia o que deveria escolher.
Olhava as vitrines da lojas mas nada a agradava, nada lhe chamava a atenção.
Ele deixou-a livre para escolher, podia ser qualquer coisa ou tudo. Esse era o grande problema... quando se pode ter tudo não há nada que realmente interesse.
De repente veio a idéia, entrou na loja e pediu: "pijama sem bichinhos, sem ursinhos fofos, cachorrinhos ou menininas. Apenas um pijama".
Uma, duas, três, cinco lojas e nada.
Ela queria apenas um pijama que não a deixasse parecer uma idiota. Não queria enterrar o amor nesse túmulo.
Só um pijama.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

A morte do pai

Era manhã de um dia qualquer de um mês que não me lembro. Se não me falha a memória, era uma quarta feira chuvosa.
Eu estava no meio de uma aula de português da professora Lúcia, de quem tenho boas lembranças. Ela era daquelas professoras capazes de te fazer gostar das piores matérias, era bonita, sorridente e tratava dos assuntos mais árduos da apredizagem infantil com leveza e simplicidade. Eu adorava aquela aula.
Aos 8 anos de idade eu era uma menina frágil, muito magra, feinha e, certamente, não era a mais popular da escola. Tinha vergonha de tudo, tentava insitentemente misturar-me à paisagem e não chamar atenção, morreria se alguém me chamasse à lousa. E assim caminhava minha vida, quase anonimamente.
A certa altura da minha manhã, a corrdenadora Rosangela (era uma psicóloga muito intrometida, eu não gostava dela) interrompe a minha aula preferida e para minha surpresa e terror, chama pelo meu nome. Não bastasse o susto em ouvi-la também pediu para que eu levasse todo o meu material.
Lembro-me de ter guardado minhas tralhinhas com os olhos grudados no chão, eu sabia que todos estavam me observando e isso era insuportável para a minha timidez. Saí da sala confusa, sem saber o que pensar. Antes de atravessaar a porta voltei-me para trás e meus olhos desesperados encontraram o olhar da minha querida professora. Eu não saberia interpretar aquele olhar, talvez um misto de pena com dúvida, não sei. Caminhei para a sala da coordenadora intrometida como se tivesse duzentos quilos em cada perna, eu me arrastava por aquele corredor. Não sabia o que esperar, apenas imaginava que algo muito grave acontecera, mas o que?
Ao entrar naquele cubículo chamado coordenadoria, ela me disse num tom grave "vá para casa, sua mãe espera por você". Meu constrangimento não me permitiu perguntar o motivo, apenas abaixei a cabeça e fui embora da escola.
A essa altura do campeonato minha cabeça estava vazia de pensamentos e sentimentos, não sei explicar. Apenas não pensava em nada.
Minha casa era muito perto da escola, chequei rapidamente e ao abrir a porta de de cara com um tio que raramente nos visitava, fiquei feliz e aliviada, mas esse alívio durou o tempo de ampliar o olhar para o resto da sala e encontrar os rostos de minha mãe e irmã, inchados, lacrimosos, tristes. A felicidade inicial fora substituída por um sentimento de confusão e dúvida.
Meu tio pediu-me que sentasse no sofá, um sofá antigo com base de madeira e almofadas muito azuis. E deu-me a notícia com um sorriso nervoso nos lábios, imagino como deve ter sido difícil para ele naquele momento encarar uma criança de 8 anos e dizer que seu pai estava morto, e ele o fez com uma competência invejável.
"Aconteceu uma coisa ruim, muito triste. Seu pai morreu"..... silêncio....."Tudo bem? Vc está bem?"...silêncio novamente..."Estou"
Lembro-me da sensação de não entender o porque do choro da minha mãe, ela sempre falou tão mal dele... Que tristeza era aquela? Eu não entendia.
Não me senti triste. Coloquei o meu vestido mais bonito, cor de rosa de laise, e fomos para Cravinhos. Eu nunca tinha ido a um velório, foi minha estréia, e confesso senti me como em uma festa. Conheci primos que não conhecia, muito bacanas e simpáticos. Pessoas que eram "famíla", mas completos estranhos pra mim. E uma avó, a grande culpada pelo vício de meu pai.
Mas isso é história para outro post.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

O que faz de uma história algo verdadeiro?

A percepção distorce de acordo com quem a conta. Quem não conhece o ditado que diz: "quem conta um conto aumenta um ponto"?
Portanto, mesmo as histórias que julgamos como verdadeiras são em parte inventadas pela nossa forma de perceber o mundo, pelo olhar distorcido que fazemos da realidade, de acordo com as nossas vivências, crenças e carências.

Todas as histórias descritas aqui serão em parte verdadeiras, e em parte inventadas. O leitor nunca terá certeza de qual parte corresponde a que... e isso não é importante.

Relaxe, divirta-se e viaje. Essa aventura está só começando.